domingo, abril 30, 2017

O ovo cósmico de Hildegard de Bingen

Ilustração "O ovo cósmico ardente" por Hildegard von Bingen, presente no manuscrito "Scivias" (século XII)
Hildegard von Bingen foi uma monja beneditina que viveu entre os séculos XI e XII numa região onde hoje seria a Alemanha. A ilustração acima é fruto de uma das cosmovisões místicas de Hildegard, revelando interpretações acerca do firmamento e da existência no mundo terreno.
O "ovo cósmico" envolto em chamas, apresenta no topo a figura da estrela do Sol, acompanhado por três estrelas menores (provavelmente os planetas conhecidos de Marte, Júpiter e Saturno). Na camada mais adentro, pilhas de granizo a emitirem como línguas de raios. A figura dentro dessa moldura assemelha-se a um formato de amêndoa repleto de estrelas douradas, a Lua e duas estrelas vermelhas (provavelmente Mercúrio e Vênus). Indo mais para o centro da ilustração, encontramos dez espécies de montes verdes seguidos por uma camada violeta de linhas aninhadas como um novelo, assim como uma camada azul-claro que pode corresponder à nossa atmosfera. No centro dessa espécie de mandala, encontramos o que Hildegard chamava de "globo arenoso de grande magnitude" (a Terra), com uma espécie de rio (mar) que a atravessa na ilustração. Cada camada possui também uma fonte específica de vento, representada por uma forma tri-facial.
Hildegard comparava Deus a um ovo cósmico que ardia em chamas no Universo, esvaziando-se e preenchendo-se como um útero, a alimentar toda a vida presente nele. Um sagrado feminino como Amor Divino, a essência do Universo, a força flamejante a queimar no sol, na lua, nas estrelas movendo tudo para uma existência e trazendo toda vida a brilhar com essa luz.
Aqui refletindo, concluo: Hildegard trouxe à tona o feminino como a essência da vida, da existência, do universo. Por que ainda as sociedades ocidentais insistem na diminuição desse mesmo feminino? (Para reflexão!)

Horace Walpole

Literato, antiquário e historiador da arte, Horace Walpole viveu no século XVIII na Inglaterra e foi um entusiasta da arte gótica, naquela época ainda considerada uma arte grotesca, estranha (já que a referência de ARTE seriam as produções da ordem greco-romana). Na contramão daquilo que seria o padrão da época, Walpole explorou as possibilidades do gótico na arquitetura, na literatura, no mobiliário. Seu jeito afeminado e gosto por uma estética que não seria considerada tão viril como a do Homem Vitruviano (o cânone das proporções humanas), mas antes uma arte "diferente" o aproximou de um arquétipo de "queer" (uma palavra inglesa que nos séculos 16 e 17 significaria algo como "estranho", peculiar", "excêntrico"), uma referência a algo ou alguém que fosse considerado um desvio do padrão!

a visão

Entre os séculos XIII e XIV na Europa, o sentido da visão humana era compreendido de uma maneira bastante peculiar. Já se acreditava na época que o enxergar não terminava apenas no olho. No cérebro humano, haveria uma espécie de sistema formado por cinco regiões que processariam a visão. O filósofo persa Avicenna (980-1037) apresentou um esquema do cérebro onde o olhar humano percorria. Primeiro seria a área do "senso comum" onde se apreendia as aparências das coisas; depois, a célula da imaginação (ou ymaginatio vel formalis) que retinha as formas percebidas; em seguida a "estimativa" era responsável em julgar essas percepções; seguida pela "cogitativa" responsável por combinar imagens e possibilitar a imaginação de seres e coisas fantásticas; e por último, na região posterior da cabeça estaria o "armazém" da memória (vis memorativa), havendo em sua abertura o "verme do cerebelo" que se abria para deixar as imagens entrarem na memória.
Apesar das ciências modernas terem posteriormente refutado essas interpretações, eu considero de uma riqueza extraordinária muitas das visões de mundo que sociedades anteriores à nossa construíam! Significados mágicos e simpatias se perdem nesse nosso mundo que se obriga a racionalizar tudo, tornando a existência cinza e muitas vezes enfadonha. Sejamos um pouco mágicos sempre! Não deixo de acreditar em astrologia, nas rezadeiras, nas mudanças de tempo e humores, mau-olhado, circulação de energias, força de pensamento, previsões. A vida é muito mais matizada assim!
Na gravura: O diagrama de Avicenna, datado em c. 1300. Obs: Reparem no "verme" localizado na entra da câmara da memória!

sonho

Eu acho que há uma força, uma projeção de vidas passadas, uma confluência de energias para que eu continue no Rio de Janeiro! E o que mais evidencia isso são os meus sonhos! Sonhei essa semana que morava numa casa semelhante à casa da minha avó em Gravatá, só que era uma casa mais "vintage" com uma coisa meio tropical neovitoriano, e a casa parecia estar situada num tempo de primeiras décadas do século XX, resplandecente e com a varanda de cara para o Corcovado! Que sonho lindo! E meus pais estavam na casa e me diziam "esse é seu lar!" Bem...com sonhos emaranhados assim em espaço-tempo-afetividades não se brinca!

tinder

Onde estão os espaços físicos de sociabilidade? As horas marcadas e o compromisso de não cancelar encontros meia hora antes? O tête à tête e as conversas acaloradas numa mesa de bar? Livre da síndrome do "ah, achei interessante, mas o próximo da fila sempre será mais"....

coração

Tenho um coração vasto. Mas que não se coloca intrometido. Ele pede licença, bate antes de entrar, traz consigo um agrado antes mesmo de puxar um assunto. Um coração vasto. Sincero e sagaz. Cinematográfico. Espalhado como orquestra. Um coração que partilha, sente, compartilha, tece empatias, que ainda percebe o que pode ser amar sem esperar. Um coração atento, que ouve (sentidos internos e ruídos lá fora). Que já não sonha, mas sorri e se coloca aberto, sobretudo nas grandes metrópoles. Pouco assustado, mas astuto. Não é coração de Fagner ou Roberto Carlos, mas sim um coração de Wilde, Brecht, talvez Hilst. É um coração vasto (não consigo definir melhor).